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MAIS DE 20 ORGANIZAÇÕES PORTUGUESAS DENUNCIAM INCUMPRIMENTOS DO PEPAC DE PORTUGAL À COMISSÃO EUROPEIA

22 organizações portuguesas enviaram hoje à Comissão Europeia uma carta onde denunciam o incumprimento do Regulamento relativo ao Plano Estratégico da Política Agrícola Comum (PEPAC) e das Recomendações da Comissão Europeia para a elaboração deste Plano Estratégico em Portugal.

Em causa está o Plano Estratégico da Política Agrícola Comum (PEPAC), apresentado por Portugal à Comissão Europeia a 30 de dezembro de 2021 que, segundo as organizações que enviaram esta denúncia, apresenta 2 grandes falhas: não está de acordo com o Regulamento (UE) 2021/2115 que estabelece as regras para a elaboração dos Planos Estratégicos pelos Estados-Membros no âmbito da Política Agrícola Comum (PAC), e não cumpre todas as recomendações da Comissão Europeia para a preparação do PEPAC em Portugal. O PEPAC encontra-se agora em apreciação pela Comissão Europeia, aguardando-se em breve a publicação da observation letter da Comissão sobre o PEPAC português.
 
O documento enviado hoje à Comissão Europeia apresenta as falhas e imprecisões no Plano Estratégico apresentado por Portugal. Para estas organizações, o diagnóstico da agricultura nacional apresentado no PEPAC é muito incompleto e desatualizado, já que o Recenseamento Agrícola de 2019, divulgado pelo INE em março de 2021, é ignorado em partes muito importantes do diagnóstico e mesmo na avaliação ex-ante, onde é mais de uma vez referido que não existem dados suficientes sobre a estrutura das Explorações Agrícolas posteriores a 2009.
Também não está explicado de que forma os ecorregimes, uma das novidades da nova PAC para o período 2023-2027, respondem às necessidades identificadas, nem como contribuem para a realização das metas estabelecidas. Adicionalmente, o PEPAC português não demonstra a complementaridade e a não-sobreposição de práticas agrícolas promovidas por diferentes intervenções ambientais e climáticas (condicionalidade, ecorregimes, medidas agroambientais) e não explica nem fundamenta devidamente como foram determinados os montantes dos apoios a atribuir, nem os respetivos métodos de cálculo ou os seus pressupostos.
 
A participação efetiva das organizações da sociedade civil, tal como exigido pelo Regulamento (UE) 2021/2115, também não foi assegurada. As organizações consideram que não foi estabelecida uma verdadeira parceria com atores relevantes e as poucas oportunidades de participação foram insuficientes (consultas públicas com prazos muito curtos em relação ao volume de informação a analisar), incompletas (nem toda a documentação apresentada à Comissão Europeia foi sujeita a consulta pública), e inconsequentes (as contribuições apresentadas nas duas consultas públicas conduziram a muito poucas alterações nos textos iniciais). Mesmo assumindo que a Comissão de Acompanhamento da Revisão da PAC, criada pelo Governo português em 2017, constitui a "parceria" recomendada no Regulamento (UE) 2021/2115, vários dos seus membros demitiram-se no ano passado devido à forma não transparente e não participativa como os trabalhos desta comissão decorreram. Em agosto de 2021, assistiu-se ao nascimento da Coligação Cívica “Participar no PEPAC”, que estas organizações integram, a mais forte evidência empírica do não envolvimento da sociedade civil neste processo.
 
Também a avaliação ex-ante, obrigatória de acordo com o Regulamento, está incompleta uma vez que se centra apenas na análise SWOT (do inglês “Strengths, Weaknesses, Opportunities and Threats”) e na avaliação das necessidades, não incide sobre as medidas definidas e não foi sujeita a consulta pública. A Avaliação Ambiental Estratégica (AAE), também obrigatória, pautou-se pela ausência de consulta às organizações ambientais e de consulta pública. Aliás, a AAE não terá ainda sido enviada à Comissão Europeia, sendo desconhecido o seu conteúdo.
 
O próprio Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) teve de participar nas duas consultas públicas alargadas por não ter sido devidamente envolvido na preparação do PEPAC, com a agravante de todas as medidas relacionadas com a biodiversidade não terem sido propostas por este organismo, com funções de Autoridade Nacional de Conservação da Natureza. Acrescentam também que, não estando o PEPAC alinhado com o Quadro de Ação Prioritário (que define as intervenções a realizar na Rede Natura 2000), torna-se impossível avaliar a extensão da sua contribuição para os objetivos desta rede de conservação da natureza da União Europeia.
 
Esta carta de alerta refere também que as recomendações da Comissão Europeia para a preparação do Plano Estratégico não foram seguidas já que a necessidade de travar a perda e a degradação de habitats em resultado da atividade agrícola e da sua intensificação não foi considerada, bem como os impactos negativos destas práticas sobre espécies com um estado de conservação desfavorável. Por exemplo, não estão previstas intervenções ou identificação de necessidades relacionadas com a possibilidade de reduzir a utilização total de água (e.g. utilizando culturas mediterrânicas de sequeiro, com menores requisitos de água), exceto através da eficiência da utilização da água (cujos ganhos são anulados pelo aumento significativo da área de regadios). Também não há qualquer intervenção identificada para apoiar a utilização de ferramentas de monitorização de emissões de Gases com Efeito de Estufa (GEE) nas explorações agrícolas. Perante as previsões da intensificação de aridez em grande parte do território nacional, é estranho que este plano não contemple medidas que incentivem uma agricultura mais ecológica.
 
As organizações apontam também que o orçamento para as medidas dedicadas ao conhecimento corresponde a apenas 0,63% do orçamento do PEPAC, um valor claramente insuficiente para satisfazer as necessidades identificadas pela Comissão. Recorde-se que Portugal é o país da UE com o 2.º pior desempenho do seu Sistema de Inovação e Conhecimento Agrícola.
 
Neste alerta, apela-se à Comissão Europeia que solicite ao Governo português o cumprimento das regras estabelecidas no Regulamento, bem como as recomendações da Comissão, revendo o Plano Estratégico e assegurando a participação adequada e formal da sociedade civil neste processo e a coerência deste instrumento com outros compromissos nacionais e internacionais.

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